terça-feira, 30 de agosto de 2016

No mundo do trabalho precário, 'Roma, Ore 11' (Roma às 11 Horas), clássico do Neo-Realismo, se mantém mais atual do que nunca! - Marcos Doniseti!

No mundo do trabalho precário, 'Roma, Ore 11' (Roma às 11 Horas), clássico do Neo-Realismo, se mantém mais atual do que nunca! - Marcos Doniseti! 
"Roma, Ore 11" (1952) é um clássico do Neo-Realismo italiano, dirigido por Giuseppe De Santis, e que mostra os principais problemas sociais da Itália nos primeiros anos do Pós-Guerra: Desemprego, fome, miséria, prostituição.  
Giuseppe De Santis e o Neorrealismo Italiano!

Este belo e clássico filme do Neo-Realismo italiano resume, em pouco mais de uma hora e quarenta minutos, aqueles que eram alguns dos mais importantes problemas econômicos e sociais da Itália nos primeiros anos do Pós-Guerra: fome, miséria, desemprego, prostituição.

Esta produção é de autoria de Giuseppe De Santis, que foi um dos principais diretores do Neo-Realismo, movimento cinematográfico que recebeu forte influência do realismo poético francês dos anos 1930 (Jean Renoir, Marcel Carné), do cinema de vanguarda soviético (de Sergei Eisenstein) e do Policial Noir. 

Muitos dos diretores do Neo-Realismo (Vittorio De Sica, Roberto Rossellini, Luchino Visconti, Giuseppe De Santis, Michelangelo Antonioni) já estavam envolvidos com o Cinema italiano na época do regime Fascista liderado por Mussolini, fosse trabalhando como atores, diretores, roteiristas ou mesmo críticos da revista 'Cinema', que foi publicada na época do regime Fascista e que tinha Vittorio Mussolini (filho do Duce) como o seu diretor. 

Giuseppe De Santis foi crítico da revista e trabalhou como diretor assistente e também foi um dos roteiristas daquele que é considerado por muito como sendo o marco inicial do Neo-Realismo, que é o filme 'Ossessione', de Luchino Visconti, de 1943, e que foi baseado no romance policial Noir 'O Destino Bate à Porta', de James M. Cain. 
O lema de Mussolini (plagiado de Lenin) era 'O Cinema é a Arma mais Forte'. De fato, até antes da massificação alfabetização universal e da Televisão, que irá ocorrer apenas na década de 1960, o Cinema era a principal forma de comunicação visual para se atingir toda a população. E o regime fascista fez uso intensivo do mesmo para pacificar e alienar o povo italiano.
Desde a época do Fascismo já se produziam alguns filmes que procuravam mostrar o povo italiano nas telas de cinema. 

Mas enquanto o regime Fascista queria mostrar um povo e uma Itália idealizados, tais cineastas ou críticos (muitos deles com ideias esquerdistas), os criadores do Neo-Realismo, optaram por um caminho totalmente diferente, escolhendo mostrar a realidade dos italianos, sem qualquer tentativa de edulcorar ou idealizar a mesma, fato este que levou as suas primeiras produções a serem censuradas pelo regime Fascista. 

Inclusive, o próprio Mussolini teria dito que 'Isto não é a Itália', depois de assistir a 'Ossessione', e a Igreja Católica (que apoiava Mussolini) também pressionou e conseguiu que o filme de Visconti fosse censurado, afinal ele mostrava um caso de traição, adultério e assassinato. 

Assim, o Neo-Realismo vai mostrar o povo italiano, e a realidade em que vivia, nas telas do Cinema, revolucionando o cinema mundial, sendo que a sua influência se fez sentir muito fortemente nas décadas seguintes pelo mundo afora (casos do Cinema Novo brasileiro e do Cinema Iraniano). 
Vários dos cineastas, atores e roteiristas que se consagraram na época do Neo-Realismo começaram a se envolver com o Cinema na época do Fascismo. Mas o tipo de Cinema que o regime Fascista produzia visava promover uma alienação do povo italiano em relação à realidade na qual o mesmo vivia (a capa da edição acima já deixa isso bem claro, aliás). Já o Neo-Realismo fez exatamente o contrário.
Desta maneira, muitos dos atores dos filmes neo-realistas eram pessoas comuns, do povo, que interpretavam a elas mesmas, e as locações eram naturais, feitas ao ar livre, nas cidades, fazendas, até para se diferenciar do cinema italiano falso e artificial produzido na época do regime fascista, feitos em estúdios e cujas produções não tinham qualquer conexão com o cotidiano dos italianos. 

Na época do Fascismo, as filmagens eram feitas nos imensos estúdios da Cinecittá, que foram construídos por Mussolini (que os inaugurou em 1937) para viabilizar uma produção cinematográfica italiana, a fim de ter condições de enfrentar o imenso poder de Hollywood. E Mussolini fez isso criando uma Hollywood italiana. Entre 1937 e 1943, a Itália produziu mais de 300 filmes. 

Mas tais filmes tratavam apenas da vida dos ricos, ou então exaltavam a Itália oficial (suas glórias militares), não possuindo qualquer conexão com a vida do povo italiano, que era marcada pela pobreza, desemprego e pelo atraso econômico do país. 

Muitas produções deste período ficaram conhecidas como os filmes do 'Telefone Bianchi' (Telefone Branco), que eram comédias ligeiras, sendo desprovidas de quaisquer pretensões artísticas e que evitavam fazer qualquer tipo de crítica à sociedade da época (críticas ao governo, então, nem pensar). Era puro escapismo, portanto, algo bastante comum na época da Grande Depressão, que atingiu o mundo todo, incluindo a Itália, é claro. 
'Telefone Bianchi' foi o nome que se deu a um subgênero de filmes produzidos na época do regime Fascista e que procurava gerar um sentimento de escapismo no povo italiano, para que este esquecesse da realidade de pobreza e desemprego na qual vivia. Tais filmes mostravam a vida dos ricos e o nome do estilo deveu-se ao fato de que, na época, somente os ricos tinham dinheiro para comprar e usar aparelhos de telefone da cor branca. Os telefones usados pelo povo italiano eram pretos.
Estes filmes eram chamados de 'Telefone Bianchi' porque os telefones brancos eram exclusivos das camadas ricas da população e eles sempre apareciam neste tipo de produção, que mostrava apenas a vida dos mais ricos, e que predominou na Itália entre 1936 e 1943. Já as camadas populares italianas usavam telefones pretos, mais baratos.

A partir de 1943, no entanto, o cenário da produção cinematográfica italiana se modificou radicalmente. O regime fascista enfrentou uma crescente Resistência (que contou com grande participação dos comunistas) e o mesmo desmoronou depois que os Aliados (americanos e britânicos) invadiram o Sul do país em Julho de 1943. 

Com isso, os antigos aliados fascistas do Duce derrubaram Mussolini do poder, prendendo-o logo na sequência. 

Embora um regime fascista fantoche, controlado pelos alemães, tenha sido instalado no norte da Itália (foi a chamada 'República de Saló'), o novo governo italiano (liderado pelo Marechal Badoglio) levou o país para o lado dos Aliados (Setembro de 1943). E Mussolini acabou sendo morto no final de Abril de 1945, poucos dias antes de Hitler cometer suicídio. 

Desta maneira, com o fim do Fascismo, os cineastas, roteiristas, produtores, críticos de cinema e atores italianos passaram a desfrutar de uma liberdade de criação que, até então, era inédita no panorama cultural do país, embora em alguns casos a censura mostrasse as suas garras. 
Giuseppe De Santis foi um dos mais importantes cineastas do Neo-Realismo italiano e para muitos estudiosos da sua obra 'Roma, Ore 11' é a sua obra-prima. Para a realização do filme, o futuro cineasta Elio Petri realizou uma minuciosa e exaustiva pesquisa, entrevistando inúmeras pessoas que se envolveram com o incidente que é retratado no filme. 
E foi neste contexto que surgiu e se desenvolveu o Neo-Realismo, do qual Giuseppe De Santis foi um dos principais nomes.

E o filme 'Roma, Ore 11' já representava uma mudança de rumo nas produções neo-realistas, pois embora o mesmo ainda trate e mostre as questões sociais mais relevantes do período, ele também passa a exibir romances, histórias de amor que afetavam a vida dos personagens. Aliás, Pietro Germi fez o mesmo em 'Il Cammino Della Speranza' (já comentado aqui no blog). 

Esta foi uma maneira que alguns cineastas neo-realistas encontraram de promover uma atualização do Neo-Realismo, visto que a denúncia social presente nas primeiras produções já tinha, praticamente, esgotado a sua contribuição para o cinema italiano e o movimento já não tinha mais o prestígio e o alcance do início.

A produção do filme e a Itália da época!

A trama do filme é baseada numa história real que aconteceu em 15 de Janeiro de 1951, em Roma, quando cerca de duzentas mulheres apareceram para uma oferta de emprego (de secretária) oferecida por um contador, no qual o domínio da datilografia era essencial. Elas se aglomeraram na escada do edifício e esta acabou desabando depois que muitas tentaram subir ao mesmo tempo. O resultado foi que cerca de 80 delas acabaram feridas e uma acabou falecendo. 
A história do filme é baseada num fato que ocorreu em Janeiro de 1951, em Roma, quando cerca de 200 mulheres apareceram para conquistar um emprego de secretária. Mas havia apenas uma vaga. E o resultado foi um desastre que deixou cerca de 80 feridas, sendo que uma delas acabou falecendo. 
Na época, o fato ganhou grande repercussão na imprensa italiana, sendo que o sensacionalismo que esta promoveu na exploração do caso fica bem explícito no filme. 

Elio Petri, que se tornou um dos principais diretores do brilhante cinema político italiano dos anos 1960/70, fez entrevistas com três jovens que participaram do acontecimento, a fim de que o filme fosse o mais realista possível ao contar a história. 

A partir deste incidente, De Santis desenvolve uma história na qual vai mostrar, por meio dos problemas que as mulheres enfrentam em suas vidas, profissionais e familiares, alguns dos principais problemas enfrentados pelo povo italiano neste período de sua história, quando a Itália enfrentava os efeitos de 21 anos de regime Fascista (1922-1943) e 5 anos de Guerra (1940-1945). 

Com isso, a realidade vivida pelo povo italiano neste período era marcada pela pobreza, fome, desemprego, miséria, prostituição, falta de moradias, baixos salários, entre muitos outros. 
Simona (Lucia Bosé) e Caterina (Lea Padovani) são duas das 200 mulheres que vão em busca de emprego, mas com objetivos de vida distintos. Enquanto Simona quer trabalhar para viver junto com o homem que ama, um pobre trabalhador, Caterina deseja abandonar a prostituição, que é o seu modo de vida. 
A trama do filme!

Para contar a sua história, De Santis dividiu o filme em duas partes: Na primeira, vemos as jovens chegando ao local onde iriam fazer o teste necessário para se conquistar o emprego. E na segunda, vemos as jovens sendo atendidas no hospital, sendo que é a partir deste momento que iremos descobrir como é a vida de cada uma delas e de como isso se relaciona com os problemas que o povo italiano enfrentava neste período. 

Assim, vemos, por exemplo, Simona, que é uma bela ragazza, filha de uma família rica, mas que é apaixonada por um homem (Carlo) que vive em condições bastante precárias, sendo um humilde trabalhador que molda quadros. Quando ela está no hospital, a família dela o encontra e demonstra um grande desprezo pelo mesmo, humilhando-o na frente dela. 

Logo, o desprezo das elites pelas camadas populares fica bem evidente. E a interpretação de Ralf Vallone transmite todo o desprezo e humilhação a qual Carlo está sendo submetido. Carlo, percebendo o quanto é indesejado pela família da mulher que ama, vai embora, dizendo para a amada, Simona, que não lhe deseja criar nenhum problema e que, se ficar com ele, ela terá uma vida difícil, pois ele não sabe fazer outro ofício (esta é uma das mais belas e emocionantes cenas do filme). 
Clara é uma bela jovem que procura um emprego a fim de ajudar no orçamento familiar, o que era o objetivo de grande parte das jovens italianas da época. Nos primeiros anos do Pós-Guerra, a pobreza, o desemprego, a fome e a prostituição eram características marcantes da sociedade italiana. O 'milagre econômico' italiano começaria apenas na segunda metade dos anos 1950 e atingiria o seu auge nos anos 1960. Na banca de jornal podemos ver um exemplar do jornal "L'Unità', órgão oficial do PCI, do qual Giuseppe De Santis era membro. 
Simona sofre e chora com isso e, mesmo assim, a sua família procura convencê-la a abandonar Carlo, mas quando ela está sendo levada para casa, Simona sai do carro no meio do caminho e vai ao encontro dele. E ambos ficam felizes... Desta maneira, a vontade de Simona de ter um emprego está diretamente relacionada ao desejo dela ter o controle de sua vida e poder ter uma vida melhor ao lado do homem que ama.

Uma outra jovem (Cornelia) flerta com um jovem marinheiro enquanto aguarda a abertura do portão. Ela lhe passa o seu endereço, mas recebe um bilhete dele, pelo qual fica sabendo que ele estará prestando serviço em Mogasdício (na África). 

Outra das jovens que tentou conseguir o emprego de secretária é Matilde, que veio do interior e que é muito pobre. Ela não deseja mais retornar para a sua cidade de origem, devido à extrema pobreza existente ali. Espertamente, ela passa na frente e consegue ser testada antes de todas, mas ela é muito lenta para datilografar. Mesmo assim, ela continua no lugar, na esperança de conseguir o emprego. No final, ela conseguirá o emprego em uma casa, cuja empregada anterior (Angelina) abandonou o trabalho depois que entrou em conflito com os patrões.  

Adriana, por sua vez, entra no escritório para fazer o teste, mal consegue controlar as emoções e acaba chorando. Mais adiante ficamos sabendo, quando estava sendo atendida no hospital, que ela estava grávida e que o responsável por isso era o seu antigo patrão, um advogado casado que a seduziu com a promessa de que eles iriam ficar juntos, mas que a desprezou quando descobriu sobre a gravidez. E este foi o motivo dela ter pedido demissão de seu antigo emprego. 
Simona (Lucia Bosé) era apaixonada por Carlo (Ralf Vallone), um trabalhador pobre, mas a sua família era rica e desprezava seu namorado em função da sua origem humilde. O desprezo dos ricos pelos mais pobres é um sentimento que atravessa fronteiras. O Brasil atual que o diga... 
No entanto, Adriana escondeu este fato de todos, em função da vergonha e da humilhação a que seria submetida quando o mesmo fosse descoberto. O pai a leva embora (de charrete), mas diz que ela não entrará mais em sua casa. Porém, quando chegam ao local, os vizinhos e amigos a recebem como se ela fosse uma heroína, pelo fato de ter sobrevivido ao acidente, e o pai permite que ela permaneça vivendo ali. 

Desta forma, além de serem enganadas por homens casados e ricos, as jovens e pobres mulheres da época também eram vítimas dos valores tradicionais que vigoravam na sociedade e cujo conservadorismo não era exclusivo das classes abastadas, mas eram defendidos, também, pelos setores mais pobres da população. 

Até mesmo uma prostituta (Caterina) aparece para conseguir o emprego de secretária, pois ela deseja sair das ruas e passar a ter uma vida normal. Ela é vaidosa, mas vive em uma região muito pobre da cidade de Roma e até mesmo um dos seus clientes a abandona quando vê a miséria do lugar. Caterina chegou a emprestar a bolsa de uma amiga, na expectativa de que se ela fosse com uma bolsa mais bonita ela poderia conseguir o emprego. 
Elena Varzi (primeira à direita) interpreta uma jovem e humilde mulher que engravidou do seu antigo patrão, um rico advogado, e que pediu demissão em função disso. Ela se envergonha da sua condição, pois teme ser humilhada e desprezada por isso.
Clara (que é interpretada pela belíssima Irene Galter), por sua vez, é levada ao local do teste para o emprego pelo seu pai, junto com as demais filhas, e depois do acidente ela acaba conhecendo, ao ser levado para o hospital, um jovem por quem ela se sente bastante atraída. Mas o seu pai interroga o jovem pretendente, querendo saber se o mesmo possui emprego e quanto ganha, pois é claro que deseja que a sua bela filha desfrute de uma vida digna. 

Esta é uma característica marcante desta obra-prima, ou seja, as jovens procuram emprego não apenas para obter alguma satisfação pessoal, mas para aumentar o orçamento da família, que está sofrendo com a queda no valor das suas rendas (salários, pensões) ou porque tem muitas pessoas desempregadas na mesma. Uma das jovens quer trabalhar porque a família é numerosa e o único membro que tem emprego é o irmão mais velho, que está noivo, e caso ele venha a se casar, os demais integrantes da família ficarão sem ter como sobreviver. 

Este é o caso, também, de Luciana, que é uma jovem pobre, desempregada, cujo marido (Nando) também está sem trabalho e já há seis meses, apesar de procurar intensamente por um emprego. Depois que o contador anunciou que somente entre 30 e 40 jovens seriam submetidas ao teste para obter o emprego, ela ficou desesperada, pois estava entre as últimas. Daí, ela inventou uma história falsa de que precisava falar urgentemente com o contador e passou na frente das outras para poder ser testada. 
Matilde (Paola Borboni) é a primeira da fila, que ela furou, deixando a tímida Gianna (a loira atrás dela) para trás. Matilde queria obter um emprego em Roma a fim de não ter que voltar mais para a pequena e pobre cidade de origem. A migração interna (da área rural para a urbana) foi uma realidade muito presente na Itália do Pós-Guerra. Em 1950, 40% dos italianos ainda viviam na área rural. Em 1971, esse percentual tinha se reduzido para 16%.
Quando ela sai do local, é ofendida pelas demais jovens, sendo que muitas destas tentam subir pela escada, que acaba não suportando o peso de todas e desaba. 

Dezenas de jovens ficaram feridas em função disso, e uma delas ficou em estado grave (irá falecer ao final do filme), fatos este que fizeram Luciana sofrer e chorar, pois se sentia culpada pelo que havia acontecido. O marido lhe dá todo o apoio possível, procurando tranquilizá-la, mas no final ela acaba sendo interrogada pela Polícia, que investiga o caso e deseja saber o que foi que aconteceu. 

Luciana quase chega a cometer suicídio, mas o desespero do marido (Nando) ao perceber qual era a sua intenção parece tê-la feito mudar de ideia. Depois que ela explicou o ocorrido, o próprio chefe de Polícia percebe que ela é apenas uma jovem pobre que está desesperada a procura de um emprego e que não tem culpa pelo que aconteceu. 

Após o acidente, as jovens foram levadas a um hospital, onde são bem atendidas, mas vão todas embora quando descobrem que terão que pagar 2300 Liras por cada dia que ficarem ali. Isso acontece em função do fato de que elas não tem emprego, então as jovens não podem fazer uso gratuito dos serviços de saúde.
Nando e Luciana são um casal de trabalhadores desempregados. Ela fica tão desesperada para conseguir o emprego de secretária que irá furar a fila, o que desencadeará uma grande confusão, que gerou o acidente no qual cerca de 80 mulheres ficaram feridas e uma faleceu. Apesar disso, Nando nunca a abandonou. 
Desemprego, pobreza, fome, miséria, prostituição, exclusão social, preconceitos elitistas, rígidos valores conservadores: Todos os principais problemas da sociedade italiana da época são mostrados neste clássico filme neo-realista de um diretor que nunca desfrutou do mesmo prestígio de Rossellini, De Sica ou Visconti, mas que realizou uma bela obra. 

Além disso, esta obra do diretor De Santis tem uma ótima trilha sonora, as interpretações das (os) protagonistas são muito boas, transmitindo na medida certa as emoções daqueles homens e mulheres desesperados, que lutam incansavelmente para ter um emprego decente e, assim, poder construir uma vida digna. 

Portanto, "Roma, Ore 11" defende a ideia de que é por meio da valorização do trabalho honesto e digno que se consegue promover a construção de uma identidade pessoal positiva a fim de se poder viver em sociedade. 

Em uma época, como esta em que vivemos, o filme clássico de Giuseppe De Santis é mais atual do que nunca. 
No caminho para o hospital, Clara conheceu um jovem pelo qual se sentiu atraída. Mas o seu pai somente irá concordar com um relacionamento entre ambos se o mesmo tiver um emprego e um bom salário, pois não quer ver a sua bela filha passando necessidade.
Afinal, vivemos em um período histórico no qual o desemprego estrutural tornou-se um problema para muitos países, o movimento sindical se enfraqueceu no mundo inteiro e o trabalho precário se espalhou por todo o planeta, o que está gerando um clima de crescente insatisfação popular mesmo nos países desenvolvidos (vide a saída do Reino Unido da UE, a força da candidatura de Donald Trump nos EUA e a ascensão de forças de Esquerda e de Extrema-Direita na União Europeia). 

Assim, em uma época histórica no qual a Globalização Neoliberal, com a sua deliberada intenção de precarizar as relações trabalhistas no mundo todo, fazendo com que o Precariado seja a 'classe social em formação' (na expressão de Guy Standing) que mais cresce no mundo e que temos um governo ilegítimo no Brasil que deseja transformar os empregos dos brasileiros em empregos precários (desprovido de direitos e até inviabilizando a sua capacidade de se mobilizar e de se organizar em defesa destes direitos, por meio da terceirização generalizada e da 'flexibilização' da CLT), este clássico de Giuseppe De Santis demonstra toda a sua atualidade. 

O fato de que, por exemplo, uma elevada taxa de desemprego obriga as pessoas a aceitar o primeiro emprego que aparece, mesmo que as condições de trabalho sejam ruins e que os salários sejam baixos, está presente neste filme de 1952. Em uma das cenas, bastante didática a respeito, as jovens conversam sobre qual seria o salário que seria oferecido. Uma delas fala que somente aceitaria o emprego se o mesmo fosse de 15.000 Liras, mas outra diz que aceitaria o mesmo por um salário de 10.000 Liras...
Elena Varzi, Lea Padovani, Lucia Bosé e Carla Del Poggio eram quatro das principais atrizes italianas da época. Ralf Vallone e Massimo Girotti, que protagonizam os papéis masculinos, também eram bastante populares e excelentes atores, tendo ótimas atuações neste clássico filme neo-realista. Assim, em seu filme, Giuseppe De Santis reuniu um elenco bastante popular e talentoso. 
E não é exatamente isso que acontece em momentos históricos no qual temos uma elevada taxa de desemprego, que é o que ocorre no mundo atual? Atualmente, a Itália, por exemplo, tem uma taxa de desemprego de  

Assim, De Santis realizou uma obra clássica, que é fundamental para se compreender a realidade italiana dos primeiros anos do Pós-Guerra, mas que também pode ser vista como uma obra extremamente atual, visto que vários dos problemas que são apontados por ele em seu filme estão cada vez mais presentes no mundo em que vivemos. 


Links:

Informações sobre o filme:

http://www.imdb.com/title/tt0045098/?ref_=fn_al_tt_1

"Roma, Ore 11"- Um Estudo sobre o filme (de Silvia Pagni):

http://mda2012-16.ilmondodegliarchivi.org/index.php/studi/item/287-roma-ore-11-di-giuseppe-de-santis-nelle-carte-darchivio

Livro de Elio Petri: 

http://sellerio.it/it/catalogo/Roma-Ore-11/Petri/715
Elio Petri fez uma pesquisa detalhada e exaustiva a respeito do episódio que gerou o filme. Sua pesquisa foi, posteriormente, publicada em um livro (1956) e foi adaptada para o Teatro. Nos anos 1960/1970 ele realizou alguns dos mais importantes filmes da era de ouro do Cinema Político Italiano, como os clássicos 'Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita' (1970) e 'A Classe Operária Vai ao Paraíso' (1971). 
Informações Adicionais!

Título: 'Roma, Ore 11' (Roma às 11 Horas);
Diretor: Giuseppe De Santis;
Roteiro: Cesare Zavattini, Giuseppe De Santis, Basilio Franchina, Rodolfo Sonego, Gianni Pucini.
Duração: 108 minutos;
Gênero: Drama;
Ano de Produção: 1952; 
Países de Produção: Itália e França;
Elenco: Lucia Bosé (Simona, filha de família rica); Ralf Vallone (Carlo, namorado de Simona); Elena Varzi (Adriana, mulher grávida); Massimo Girotti (Nando, marido de Luciana); Irene Galter (Clara, bela e elegante jovem que fala francês); Carla Del Poggio (Luciana, mulher acusada); Maria Grazia Francia (Cornelia); Lea Padovani (Caterina, prostituta); Delia Scala (Angelina, empregada); Eva Vanicek (Gianna, a loira tímida); Paola Borboni (Matilde, que foi testada primeiro), Armando Francioli (Romoletto, amigo de Angelina), Paolo Stoppa (Impeggiato).

Informações sobre o filme:

http://www.imdb.com/title/tt0045098/?ref_=fn_al_tt_1

Trecho do filme:

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